sábado, 16 de junho de 2012

O Estranho Caso da MMS

| Todd Drezner | 14/6/2012 | Huffpost Healthy Living |
Tradução de Argemiro Garcia

Vou dizer algo radical, algo que pode chocar. Prepare-se. Pronto? Aqui vai:
Não é uma boa idéia fazer as crianças beberem alvejante.

Se não está familiarizado com a comunidade do autismo, você pode perguntar por que essa minha declaração poderia ser questionada. Infelizmente, nessa comunidade, onde há divergências sobre tudo, mesmo esta afirmação aparentemente simples causa polêmica.

Essa controvérsia começou durante a conferência Autism One, realizada em Chicago entre 23 e 27 de maio. A conferência é uma grande vitrine para os pais que procuram tratamentos alternativos para autismo, e deu espaço para alguns dos mais famosos defensores da idéia de que as vacinas causam autismo, incluindo o já desacreditado cientista Andrew Wakefield e a mãe-celebridade Jenny McCarthy.

Mas talvez a apresentação do Autism One que mais tenha chamado a atenção este ano foi sobre um tratamento chamado MMS. Nele, Kerri Rivera, a fundadora de uma "Clínica de Autismo baseada em biomedicina na América Latina", explicou "como a MMS (dióxido de cloro) tornou-se a 'peça que faltava' ao quebra-cabeças do autismo" e como a usou para recuperar 38 crianças em 20 meses.

MMS, segundo o seu site, quer dizer Milagrosa Solução Mineral (Miracle Mineral Solution). Vá ao site e lerá que "a resposta para a AIDS, hepatites A, B e C, malária, herpes, tuberculose, mais o câncer e muitos mais das piores doenças da humanidade foi encontrada". Esses tipos de alegações genéricas, mas sem provas, são um claro sinal de charlatanismo, e comparar a MMS à "banha de peixe-elétrico" é a mesma coisa que entender que não há 23 milhões de dólares esperando por você em uma conta bancária da Nigéria.

Ao contrário de certo tipo de pseudociência, no entanto, a MMS pode ser muito prejudicial. Confira os slides da apresentação de Rivera e verá que a MMS é uma mistura de clorito de sódio e ácido cítrico, que, quando misturados, liberam dióxido de cloro. MMS, em outras palavras, é alvejante. Rivera recomenda que seja dada oralmente até oito vezes por dia. Há também um protocolo para enemas ("lavagens" retais), aplicada duas a três vezes por semana, e banhos, que podem ser tomados todos os dias.

Nos seus próprios slides, Rivera admite que a MMS pode causar febres, mas ela chama isso de "coisa boa" e recomenda fazer um enema por dia durante a febre. Ela também fala sobre o que fazer se a criança sofre uma reação de Herxheimer, que pode causar febre, calafrios, hipotensão, hiperventilação, cefaléia, elevação da freqüência cardíaca e dor muscular.

Se você não achar tudo isso terrível o suficiente, poderá ler este depoimento do pai de um menino autista não-verbal que está usando a MMS. Ela está causando vômitos e diarréia, mas o pai está frustrado porque o menino não-verbal não pode lhe dizer o que está sentindo. Bem, como você acha que ele está sentindo?

Vamos dizer o óbvio: não há razão para dar água sanitária a qualquer criança, por qualquer motivo. Não há um pingo de evidência científica de que a MMS é um tratamento eficaz para o autismo. Alguns vendedores de charlatanismo têm visto este como um mercado lucrativo e estão tentando tirar vantagem disso. Mas esse protocolo está muito mais perto de abuso infantil do que de um tratamento médico eficaz.

Infelizmente, a Autism One e aqueles que acorrem à ela têm dificuldade para reconhecer esses fatos simples. Em um post no blog Age of Autism, Julie Obradovic tenta defender a MMS sem, realmente, defendê-la. Em vez disso, ela menciona que a Autism One tem entre seus palestrantes médicos e doutores, e um Prêmio Nobel. Mas a presença de pessoas inteligentes em uma conferência que promove o charlatanismo não muda o fato de que ela está promovendo o charlatanismo.

Em segundo lugar, Obradovic argumenta que a Autism One "está cheia de boas pessoas, bons pais e grandes doutores dispostos a sofrer ataques pessoais, a fim de fazer progressos no tratamento médico de nossas crianças doentes." Se essa caracterização está certa ou não, isso realmente não importa. Novamente, as motivações das pessoas na Autism One são irrelevantes para o tema MMS. Esse é o pior tipo de charlatanismo, e a Autism One lhe deu espaço.

O que acontece é que a MMS se apoia nos mesmos argumentos que sempre dividiram a Comunidade Autista. Muitos blogueiros, durante anos têm atacado a Autism One especificamente e os tratamentos alternativos em geral (na minha opinião, com razão: há muitos tratamentos questionáveis, além da MMS, promovidos na conferência). Muitas pessoas que usam esses tratamentos contra-atacaram. O mesmo se dá com a MMS.

Mas quero deixar de lado esses argumentos, por enquanto. Esqueça todas as divisões na comunidade do autismo e apenas pense na MMS. Se você ouvisse falar sobre esse tratamento e não soubesse para que era, qual seria sua reação?

Para ser justo, alguns poucos comentários postados no post de Age of Autism têm feito este experimento mental e levantado sua voz sobre para que a MMS serve. Mas é preciso haver mais do que apenas alguns.

A questão aqui não é sobre o que causa o autismo, como tratar o autismo, ou se o autismo pode ser curado. A questão não é sobre o autismo. A questão é simplesmente se você acredita que está empurrar alvejante goela abaixo das crianças ou pelos seus intestinos.

Há muitas coisas para se discutir na Comunidade Autismo. MMS não é um deles.

Há uma petição no Change.org que solicita ao FDA, à Comissão Federal de Comércio e ao Departamento de Saúde e Serviços Humanos que emitam ordens de cessação da venda da MMS. Como é dirigida a órgãos federais dos Estados Unidos, não deve haver impacto se estrangeiros residentes em outros países a assinarem, mas você pode tomar ciência do seu conteúdo.

The Curious Case of Autism and MMS
http://www.huffingtonpost.com/todd-drezner/autism-cure_b_1588498.html


Respeite este trabalho. Se for republicar algum texto, cite-nos como sua fonte e coloque um link: http://cronicaautista.blogspot.com/

199 comentários: