| Michael Hanlon | 23 de novembro de 2011 |
A epidemia de autismo vista na maioria dos países ocidentais nos últimos 30 anos é um dos grandes mistérios médicos do nosso tempo.
A causa não pode ser alguma grande mudança genética - simplesmente não houve tempo suficiente para isto ter acontecido.
Nossas dietas não são extremamente diferentes e não há nada que sugira qualquer outro aspecto do nosso estilo de vida pode ser o culpado.
A bizarra hipótese de que certas combinações de vacinas dadas às crianças seria a culpada, já foi completamente desacreditada.
Uma "explicação" é, certamente, um excesso de diagnósticos; 50 anos atrás, falava-se em "autismo" de forma muito restrita, era considerado uma deficiência mental grave, da qual seus portadores estariam impedidos de assumir um lugar na sociedade.
Agora, crianças que sejam simplesmente um pouco obsessivas, ou que apresentem sinais de disfunção social, são rotineiramente rotuladas no "espectro autista" ou tendo "síndrome de Asperger".
Mas o diagnóstico escessivo não pode explicar completamente a ascensão - de 1-em-2500 nos Estados Unidos para cerca de 1 por cento hoje (com taxas semelhantes no Reino Unido).
Há alguns anos, o professor Simon Baron-Cohen (primo do comediante e ator Sacha), psicólogo da Universidade de Cambridge, veio a desenvolver a teoria de que algo chamado 'acasalamento seletivo' poderia ser pelo menos parcialmente responsável pelo aumento espetacular de diagnósticos de autismo.
A teoria afirma que, quando as pessoas com personalidade fortemente 'sistematizadora' - o tipo de pessoas que se tornam engenheiros, cirurgiões, especialistas em informática ou brilham em alguns aspectos do mundo dos negócios - se casam entre si e têm filhos, os efeitos desse tipo de "cérebro masculino" são geneticamente ampliados, aumentando as chances de gerar uma criança autista - que o Prof Baron-Cohen suspeita ter "cérebro masculino ao extremo".
Fortes "sistematizadores" são, muitas vezes um pouco obsessivos, perfeccionistas e dão grandes cientistas; muitas vezes são extremamente talentosos na música. Mas às vezes têm dificuldades para interagir socialmente com outras pessoas - uma combinação de características que podem misturar-se no suave final do espectro autista.
O Centro de Pesquisa de Autismo da Universidade de Cambridge agora está solicitando aos membros do público que são graduados, e a seus pais, que participem de uma pesquisa que vai investigar eventuais ligações entre desempenho educacional, o tipo de trabalho que exercem e como seus filhos se desenvolvem.
Especificamente, o novo estudo tentará descobrir se dois "fortes sistematizadores" de fato têm maior chance de gerar filhos autistas.
A teoria do Professor Baron-Cohen certamente é plausível.
Alguns dos mais fortes aumentos de diagnóstico de autismo foram encontrados no Vale do Silício, na Califórnia - onde talvez haja a maior população de sistematizadores de sucesso na Terra, as dezenas de milhares de técnicos, engenheiros e programadores que trabalham na indústria de computadores. Inevitavelmente, muitas dessas pessoas se casam (agora existem muitas mulheres trabalhando em TI, o que não era não o caso, há uma geração) e isso é uma boa, embora circunstancial, evidência da ligação entre sistematização e autismo.
Mas o que dizer de outros lugares? Por que o aumento no autismo em quase todos os lugares? Uma resposta poderia ser a mudança do papel das mulheres em geral, visto nos últimos 100 anos.
Até relativamente pouco tempo, ser excepcionalmente brilhante não era muito útil para quem fosse do sexo feminino. Na Inglaterra vitoriana, por exemplo, as oportunidades para uma mulher ganhar a vida através de suaa inteligência, por si só eram extremamente limitadas.
Segundo o Censo de 1901, havia menos de uma centena de médicas registradas em todo o Reino Unido.
Ir para a universidade era difícil e caro - a maioria sequer permitia que as meninas estudassem. Certamente havia poucas oportunidades de carreira em Engenharia ou Ciências.
A mulher poderia se tornar professora, governanta ou, talvez, se fosse excepcionalmente talentosa, ganhar a vida escrevendo, ou nas artes. A maioria das profissões eram fechadas, assim como o mundo dos negócios.
Mulheres inteligentes não eram sequer vistas como parceiras especialmente desejáveis. Os homens inteligentes ou ricos escolhiam noivas em razão da aparência, "criação", ou ambos.
Ter um QI de 140 provavelmente contaria contra. A imagem tradicional da "loura burra" pendurada do braço do político ou empresário bem-sucedido era um horrível clichê, mas tinha um fundo de verdade.
E em qualquer caso, as mulheres muito inteligentes seriam muitas vezes loucas se casassem. Até a década de 1880, mulheres britânicas que se casassem sequer podiam possuir seus próprios bens. Se tivesse um emprego, muitos patrões automaticamente despediriam uma garota no momento em que aparecesse com um anel de noivado. Assim, muitas mulheres inteligentes, "sistematizadoras", simplesmente não se casaram, ou o fizeram tarde e, provavelmente, tiveram menos filhos quando o casaram.
Agora, tudo mudou. Não apenas as barreiras legais e sociais para as mulheres trabalharem em condições de igualdade foram em grande parte desmanteladas, como também temos o fenômeno da desejável 'alpha feminina". Cinqüenta anos atrás, muitos homens tinham medo de mulheres inteligentes. Agora, cada vez mais, os machos alfa quer alguém igual a eles ou mesmo superior.
Cinqüenta anos atrás, pilotos de avião tipicamente masculino casavam com aeromoças. Agora, se casam com mulheres pilotos. Os médicos costumavam casar-se com enfermeiras, agora eles se casam com médicas.
As esposas de políticos bem-sucedidos são, cada vez mais, bem sucedido por si mesmas - e, claro, há muitas mulheres políticas bem-sucedidas.
O Professr Baron-Cohen assinala que "as fêmeas alfa" não são necessariamente fortes sistematizadoras.
Ser um político brilhante ou escritor não pode exigir um tipo de "cérebro masculino" geek que pode estar por trás do aumento do autismo.
Mas o fenômeno de casar-com-semelhante pode ter conseqüências completamente inesperadas que vão muito além da mera igualdade de oportunidades para as mulheres.
É uma teoria fascinante. Aguardamos os resultados do novo estudo com interesse.
Fonte (em 25/11/2011):
Is the changing role of women in our society behind the rise in autism in the past 30 years?
http://www.dailymail.co.uk/sciencetech/article-2064834/Is-changing-role-women-society-rise-autism-past-30-years.html
Informação complementar:
Mulheres entraram na ciência pela cozinha
| Elton Alisson | 16/11/2011 | Agência FAPESP |
http://agencia.fapesp.br/14780
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Um comentário:
Particularmente, concordo. É algo que vejo em meu próprio caso. Não sei se é possível generalizar, mas hoje entendo que misturar meus genes aos do meu marido e NÃO ter uma filha autista seria algo complicado.
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